quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Resenha da Obra "A Pérola", de John Steinbeck



STEINBECK, John Ernest. A Pérola. Lisboa: Livros do Brasil, 1996.      

‘’A Pérola’’ é uma obra fascinante de John Steinbeck escrita em 1945 onde é tratada com enorme sensibilidade e simplicidade a história de Kino e sua esposa Juana, índios, que vivendo à margem da sociedade, encontram uma pérola com o objetivo de pagar o tratamento de seu filho Coyotito, picado por um escorpião.
‘’A Pérola’’ é considerada uma parábola por já ter sido contada várias vezes e ter se enraizado na mente das pessoas e dela pode-se tirar belas lições de vida. A pérola que Kino procurava muitos a procuram hoje. Por vivemos em uma época em que as pessoas não têm tempo umas para as outras, muitas delas saem à procura de pérolas para que com elas possam resolver seus problemas. As pérolas podem ser quem sabe riquezas, amor, felicidade, etc. Como Kino vivia da pesca, foi aí que ele a buscou e encontrou.
Um aspecto bastante ressaltado é a dignidade da pessoa humana. Embora vivessem em um casebre, Kino e Juana não buscavam em meios ilícitos o seu sustento e o de seu filho. Eles passavam fome, seu filho dormia em um caixote e se percebe durante toda a leitura a perseverança, a coragem e a persistência de Kino e Juana diante das atribulações. Suas vidas são verdadeiros exemplos de humildade não só para aquela sociedade em que predominava a mesquinhez, mas para a atual, onde estão presentes defeitos piores que este.
O médico nessa obra representa o poder, o governo, o estado, a classe detentora da riqueza. Na obra, a família de Kino é tratada como mero animal. Mais uma vez se vê a predominância do ter sobre o ser, e onde só têm acesso à saúde aqueles que possuem capital. O incrível é que essa obra, embora escrita há vários anos, não se desatualiza, pois trata do social, de valores, da relação indivíduo/sociedade e os problemas sociais continuam sem solução e ocorrem em todas as sociedades. No Brasil, particularmente, não só os índios, mas negros e pobres são discriminados e não têm um serviço público que atenda a sua demanda.
Kino e Juana não tiveram acesso à educação e por mais que o medicamento feito por ela para curar seu filho fosse eficaz, ela não pensava assim. Por retratar a vida do indivíduo em sociedade, percebe-se muito a influência do pensamento da sociedade sobre o indivíduo, da classe dominante sobre a classe dominada, do médico sobre Kino e Juana. Estes preferiam acreditar na sua ignorância certa que no possível conhecimento do médico.
E quando enfim a pérola é encontrada é como se todos os problemas daquela sociedade pudessem ser resolvidos. As máscaras começam a cair. Por trás delas são vistas a corrupção, a ganância e o modo de vida do clero e a ambição e cobiça do médico e dos vendedores de pérolas. É visto o retrato do mundo capitalista onde quem manda é o dinheiro. A vida é levada ao rebaixamento total e os valores são abandonados pela sociedade.
Todos os fatos ocorridos após encontrar a pérola tornaram Kino um homem desconfiado, perseguido, angustiado. A vontade de ser feliz e de mudar sua vida e a de sua família a qualquer custo através da pérola passou a ocupar o primeiro lugar em sua vida, que mudou completamente a partir de então. Acabou perdendo sua casa, sua paz, e ao fim de tudo, seu filho, sua maior riqueza. Não conseguiu vender a pérola, devido ao seu tamanho e valor, e ele acaba devolvendo-a ao lugar de onde ela veio: o mar.
. Enfim, é a história de como uma pérola foi achada e de como ela se perdeu, levando consigo todas as esperanças de mudar de vida. Na verdade, algo que poderia salvar a vida de um homem e de sua família foi a sua ruína e desgraça e onde é coroada a vitória da sociedade sobre o indivíduo.
Embora pequena em volume, ‘’A Pérola, de John Steinbeck, é uma obra prima de grande beleza técnica, e simplicidade vocabular em que é admirável a profundidade com que é investigada a alma humana. Nela são revelados aspectos que estão presentes na vida de todos os homens: amor, o ódio, a inveja, a dor. O amor dos pais por seu filho, o ódio e a inveja dos ‘’dominadores’’ pelos ‘’dominados’’ e a dor da perda.
No livro, os protagonistas, que são índios, vivem em uma sociedade em que sofrem preconceitos de todas as ordens. Além de serem tratados como animais pelo médico, não ter dinheiro para pagar o tratamento do filho, picado por um escorpião, torna-se uma agravante.
Steinbeck afirma que nessa história há coisas boas e más, sem nada no meio. Assim são os personagens. Eles possuem características bastante distintas que os enquadram no grupo dos bons ou dos maus. Enquanto Kino é corajoso e perseverante e Juana amorosa e determinada, o médico e o padre são ambiciosos, corruptos e traiçoeiros.
Kino e Juana são de certa forma, impregnados por uma cultura e por valores que não são próprios da cultura de seu povo e eles tentam adequar-se a esse mundo que não é o deles. Tanto é que o futuro que ele sonha pra Coiotito após encontrar a pérola é um sonho americano.
No Momento em que Kino pretende vender a pérola e mudar seu destino, os grandes não permitem, tentam persegui-lo e engana-lo pelo fato de este não ser instruído. Por analogia, muitos governos não investem em educação por não quererem alterar a ordem dominadores/dominados. Para aqueles é preferível que as pessoas não tenham conhecimento de seus direitos para que não questionem as injustiças sociais.
Kino acabou pagando um preço alto por causa da ganância e cobiça dos que o rodeavam o que nos leva a desacreditar nos valores da sociedade e a pensar que não se pode tentar mudar o que se acha injusto,  principalmente quando se está sozinho ou sem o apoio da comunidade. E diante de tantas dificuldades, qualquer motivação que possa haver nesse sentido é dissipada.
Também há o interesse em um mundo governado por princípios capitalistas, onde as amizades duram enquanto durar a riqueza da pessoa. Não se está interessado no valor vida, mas na condição financeira. Nos é revelado até que ponto a inveja é capaz de levar uma pessoa e o que é capaz de fazer com seus valores.
A sociedade é retratada fielmente, com todas as suas misérias, injustiças sociais, mostrando a vida difícil não somente dos índios e dos menos favorecidos da época, mas se compararmos, a de uma realidade que perdura até hoje. Talvez por isso, Steinbeck considere essa obra uma parábola. Para que dela possamos tirar lições de vida.
Quanto ao final, ele é triste porque Kino achava que a pérola seria a solução de seus problemas. Entretanto, aquela foi responsável pela criação de novos. A sua vontade de mudar de vida falou tão alto que ele levou seus atos às últimas consequências levando sua família consigo e por falta de conhecimento deixou-se enganar por pessoas frias e interesseiras. O preço: a vida de seu filho.

8 comentários:

  1. Estou lendo este livro e estou adorando!! Bela resenha! Abraços.

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  2. Muito linda, crítica e sensível a sua resenha. Esse foi o primeiro livro adulto que li, aos 9 anos, por sugestão de minha mãe, ele me tocou profundamente.

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  3. Olá Florida. Acabei de ler esta parábola que é incrivelmente atual, pelo período a qual foi escrito. E gostei muito da sua resenha sobre o obra. Parabéns...

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  4. Adorei sua resenha, já terminei de ler o livro e vou fazer uma prova sobre ele hoje na facul. Obrigada por compartilhar sua opinião!

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